No trilho do sal: Valorização da história da exploração das salinas no âmbito da gestão costeira da laguna de Aveiro

Título:

No trilho do sal: Valorização da história da exploração das salinas no âmbito da gestão costeira da laguna de Aveiro

Resumo:

Este trabalho pretende ressaltar a importância do conhecimento das origens e desenvolvimento da exploração de sal na região de Aveiro, em ordem a uma gestão costeira que leve em devida conta a importância do conhecimento e preservação do património cultural da salicultura, evidenciando o seu interesse como mote turístico. No que respeita à exploração do sal, devemos sublinhar que se trata de uma actividade muito antiga, cuja importância ao longo da História se afigura irrefutável. Na verdade, são poucos os produtos que, como o sal, permitem um armazenamento tão fácil e, paralelamente, se compadecem tão eficazmente com ciclos especulativos. A zona do Baixo Vouga, onde se veio a formar a laguna de Aveiro, foi, por excelência, uma região profundamente ligada ao sal. Desde sempre, habituámo-nos à presença na paisagem aveirense de montes de sal acumulado junto às marinhas. Condições climáticas, geomorfológicas, político-militares e demográficas congregaram-se, numa rara coincidência, para que o litoral pré-lagunar e, posteriormente, lagunar, proporcionasse uma intensiva exploração desse autêntico “ouro branco” que foi o sal, ao longo dos tempos históricos. No caso de Aveiro, foi durante a Idade Média e, mais concretamente, no período de autonomia e afirmação de Portugal como reino independente, que se iniciou a produção intensiva de sal. O início da exploração dos chamados salgados do Vouga, fazendo eco da documentação histórica escrita da altura, coincidiu com os estágios iniciais de formação da laguna, com a pacificação do território pela migração da frente de batalha da reconquista cristã para sul e com o afluxo demográfico e de fixação populacional em Aveiro e seu hinterland. Em simultâneo com os factores aludidos verificou-se um período de amenidade climática (Período Quente Medieval também designado por Pequeno Óptimo Climático), o que certamente facilitou a produção de sal na região. Pesem embora alguns sobressaltos, o sal de Aveiro imperou nos mercados nacionais e estrangeiros até ao século XVII, tendo, entre outras, desempenhado papel de grande relevância na indústria tipicamente portuguesa de pesca e conservação do bacalhau (por salga e secagem ao Sol), para o desenvolvimento da qual foi determinante a coincidência da abundância de sal aqui existente, a disponibilidade de marinheiros e de pescadores experientes (para a pesca longínqua), um conjunto de infra-estruturas portuárias amplas e eficazes e a existência de um clima caracterizado por abundância de Sol (para a secagem do bacalhau). A partir do século XVII, a morfodinâmica lagunar, plasmada na colmatação da barra natural que se encontrava junto a Mira e, consequentemente, na perda da sua eficácia hidráulica, tornou a região insalubre e provocou o quase abandono da utilização do porto de Aveiro, ficando a exploração do sal quase impraticável. De então para cá, a paisagem do sal de Aveiro tem estado em contínuo declínio, fazendo perigar a preservação da memória de uma actividade tão característica da região e culturalmente tão interessante como fora – e é – a do amanho das salinas. Só compreendendo esta realidade na diacronia se poderá evitar a ruptura definitiva com um património cultural, ambiental e turístico de inegável interesse, como é o das salinas de Aveiro. Só respeitando os legados históricos e culturais se conseguirá uma gestão costeira integrada, eficaz e ambientalmente sustentável.

Autores:

Maria do Rosário Bastos

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